terça-feira, 24 de setembro de 2019

Carne cria ambiente de cortar à faca. Afinal, qual é o problema com as vacas?


Universidade de Coimbra abriu a polémica ao proibir carne de vaca nas cantinas. Os produtores acusaram a instituição de demagogia e o Governo dividiu-se: o ministro da Agricultura criticou; o do Ambiente aprovou. Em termos de protecção ambiental, de que serve a decisão?

Qual o impacto ambiental da produção de carne de vaca?

Há quatro consequências directas da produção de carne de vaca à escala global: a superfície ocupada pelas pastagens (para que uma vaca produza um quilo de proteína, tem de consumir entre 10 a 16 quilos de cereais); a água consumida pelos animais (para ter um quilo de carne, o consumo é de 15 mil litros de água) e pelo processo de produção; os gases de efeito estufa gerados pela flatulência do gado (segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura equivale a 14,5% do que é lançado para a atmosfera); e a energia necessária para alimentar a indústria. A estas acresce a contaminação dos solos e das águas com os dejectos dos animais.
Qual a reacção à decisão do Reitor?
Em Portugal, a decisão da Universidade de Coimbra de proibir a utilização de carne de vaca nas 14 cantinas da instituição gerou imediatas reacções. A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) não tardou em classificar a medida como “demagógica e errada”. Disse ainda que se trata de “uma precipitação do reitor” e até “um extremismo”. Seja qual for a reacção da indústria, os especialistas afirmam que a tendência será para a maior cobrança dos consumidores da demonstração da compensação carbónica efectuada para equilibrar o fabrico de um determinado produto. Politicamente, o ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, disse ser uma decisão “relevante”. Mas o da Agricultura, Capoulas Santos, disse ser “populista”.
O consumo de carne faz mal à Saúde?
Um relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) associa o consumo excessivo de carne vermelha ao maior risco de desenvolver doenças oncológicas. Sobretudo o consumo de carne processada, como salsichas, hambúrgueres ou bacon, que para a OMS entram no grupo de substâncias mais perigosas, juntamente com o tabaco ou o ar contaminado. Há que considerar ainda que os danos ambientais causados pela produção industrial de alimentos até 2050 serão responsáveis pela morte de cinco milhões de pessoas por ano, segundo um relatório da Fundação Ellen MacCarthur, apoiada pela Gulbenkian. Mata cerca de quatro vezes mais do que os acidentes de viação.
Já há outras restrições ao consumo de carne?
Antes da mais antiga universidade portuguesa avançar com a decisão de eliminar a carne de vaca das ementas das cantinas, em agosto deste ano, a Universidade de Londres tomou a mesma decisão. Uma opção que, no caso inglês, foi acompanhada pela eliminação gradual de plásticos descartáveis ou de utilização única e pela instalação de mais painéis solares nos edifícios, tendo mesmo sido assumida a meta de transformar a escola numa instituição neutra em termos de emissões carbónicas já em 2025. Também na Suíça está aberta a discussão sobre a eliminação das instalações industriais de criação de animais, tendo sido já recolhidas mais de cem mil assinaturas neste sentido.
Quais as metas internacionais para a redução de consumo?
A maior parte da população mundial, cerca de 80%, não consome regularmente nem carne de vaca nem produtos derivados de leite em grande quantidade. O consumo deste alimento está associado à melhoria das condições socioeconómicas e, por isso, as previsões são de que duplique até 2050. Mas há sinais contraditórios nos países desenvolvidos. Um estudo sobre tendências agroalimentares elaborado pelo Instituto Português de Administração e Marketing estima que, em Portugal, entre 2017 e 2027, o consumo anual per capita de carne (108 quilos) desça cerca de 10%. Também um terço dos britânicos dizem ter já parado ou reduzido o consumo.

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